As carências de infraestrutura brasileiras e as oportunidades de investimento no mercado de capitais
A retomada de um crescimento econômico consistente em nosso País precisará de um forte componente de investimentos em infraestrutura, seja pelo fato de esse segmento ser, naturalmente, um indutor do avanço do PIB (vide o new deal americano nos anos 1930 ou, mais recentemente, o crescimento espantoso da economia chinesa nas primeiras décadas deste século), seja porque o Brasil ainda possui enormes carências, por exemplo, em termos de saneamento e de transportes. E o mercado de capitais pode ter um papel importantíssimo na oferta de funding para esses investimentos.
Artigo do economista Pablo Acosta, do Banco Mundial, mostra que, como proporção do PIB, os investimentos do País em infraestrutura vêm caindo década após década, de 5% no início dos anos 1980 (antes da crise da dívida) para menos de 3% nos anos 1990, atingindo 1,6% agora, em 2020. Segundo o mesmo artigo, para dar conta de suas deficiências, seria necessário um investimento anual da ordem de 3,7% do PIB até 2030, considerando, sobretudo, a necessidade de manutenção e substituição de ativos que chegam ao fim de sua vida útil, nos segmentos de energia, saneamento, desenvolvimento digital e transportes.
Esse último setor (que mencionei propositalmente no início deste artigo) é justamente aquele que apresenta maiores lacunas de financiamento; nada menos que metade de todos os recursos necessários em infraestrutura teriam de ser destinados aos transportes, sendo que 43% teriam de ser voltados à manutenção e substituição dos ativos existentes e os 57% restantes, à construção de ativos novos.
Os sinais, felizmente, parecem ser positivos, não tanto pelos números, em si, mas, sobretudo, como tendência. O documento Carta de infraestrutura 2023, da consultoria Inter.B, indica que o País deve receber, este ano, R$ 204,6 bilhões em investimentos ou PIB, 1,95% do PIB – sendo R$ 86,2 bilhões em energia, R$ 67,5 bilhões em transporte, R$ 26,5 bilhões em telecom e R$ 24,4 bilhões em saneamento.
Ainda é pouco, considerando o tamanho de nossas necessidades, mas, como acabamos de mencionar, não deixa de ser um alento frente aos números de um passado recente. É possível, inclusive, que o recém-anunciado PAC ajude a contribuir com a melhora, muito pelo fato de haver “um olhar sistêmico sobre as notórias carências de infraestrutura de nosso País” – como avalio em nosso último artigo aqui na Suno.
Segundo o mesmo levantamento da Inter.B, cerca de 65% desses investimentos deverão vir do setor privado. E o papel do setor privado é desempenhado pela participação direta nas concessões, via operadores especializados em cada uma das atividades (muitas delas bastante específicas, como a portuária e a aeroportuária) ou pela oferta de funding para modernização, manutenção e oferta de novos ativos.
E, quando se fala de funding, alguns instrumentos do mercado de capitais podem ter um papel importante. Dois exemplos são os FI Infra (que têm de aplicar, no mínimo, 85% dos seus recursos em debêntures de infraestrutura e podem der oferecido ao varejo) e os FIP-IE (FIP Infraestrutura) – com pelo menos 90% de seu patrimônio aplicado em ações ou outros valores mobiliários ou títulos emitidos por sociedades de propósito específico que realizem investimentos em projetos de infraestrutura e disponíveis para investidores qualificados.
Lançados na década passada (e, portanto, já com algum histórico) esses dois produtos podem ser uma ponte entre o investidor que busca retornos consistentes de longo prazo e o mercado que, como sabemos, depende, cada vez mais, do setor privado como fonte de recursos.
Esse investidor, seja qualificado ou de varejo, claro, deve ter em mente as características e riscos de cada produto, assim como a importância da diversificação. Fato é que tendo em conta os notórios gaps de infraestrutura de nosso País, as oportunidades com produtos destinados a esse tipo de financiamento tendem a ser, também, enormes.
Os investimentos em infraestrutura têm como uma de suas principais características o fato de serem de longo prazo e, em geral, menos sujeitos a volatilidades que outros ativos. São, portanto, ideais para quem pensa em uma poupança para a aposentadoria. Com a população brasileira envelhecendo e o País precisando de mais recursos em infraestrutura, temos uma oportunidade nas duas pontas. É hora de olhar para o futuro.
- Engenheiro de produção formado pela USP (Universidade de São Paulo). Iniciou sua carreira em 1998 nos bancos Brascan e CCF Brasil. Em 2005, uniu-se ao time da BRZ Investimentos para desenvolver a área de Private Equity. Atualmente é CEO da companhia