Brasil deve ter juros baixos pelos próximos três anos, diz Absolute
O Brasil deve ter juros baixos pelos próximos três ou quatro anos, graças a questões conjunturais e inflação baixa, segundo a análise da gestora Absolute.
Ao casar a análise técnica com fundamentos, o principal fundo da Absolute rendeu, nos últimos 12 meses, 133% do CDI com uma carteira que contém empresas de diversos segmentos.
“Nossa carteira é super diversificada. Temos posições em praticamente todos os setores da Bolsa. Tem uma parte em commodities. Gostamos de Vale, Petro, Gerdau, gostamos de PetroRio, a gente está aumentando proteínas também”, disse Tiago Sant’Anna, sócio da empresa.
Além disso, há alguns setores que não agradam os gestores dos fundos. Um exemplo é a construção civil que, para eles, apesar do horizonte favorável, há empresas caras.
“Um exemplo é o setor de construção civil. É um setor que, com os valuations atuais, a gente não gosta. Achamos que está caro por N fatores. Até acho que construção civil no País vai bombar, só que a gente acha que tem preço. Para comprar terreno hoje já é uma briga de foice. Não é porque o setor vai bombar que vamos comprar”, afirmou Tiago Sant’Anna.
Para a Absolute, o perigo maior é o advento de uma inflação maior nos EUA que force o FED a subir os juros, trazendo uma fuga de capitais ao Brasil.
“O grande risco, na nossa visão, é aparecer inflação, mas é algo que não vemos o risco de aparecer, ao menos no curto prazo, na economia americana”, disse Christian Faricelli, um dos gestores da companhia. Confira a entrevista com os gestores do Absolute ao SUNO Notícias.
-Para começar, queria entender um pouco das estratégias da Absolute.
Tiago Sant’Anna: começamos em 2013, inicialmente como uma reunião de 9 pessoas, egressos de casas diferentes. Contamos com fundos multimercado, fundo macro para bater o CDI e fundo de arbitragem com a mesma cara, só que com operações mais correlacionadas.
A gente veio, ao longo do tempo, crescendo de forma bem responsável, de tijolo a tijolo, trazendo dinheiro para de dentro de forma responsável, captando deficiências e corrigindo-as, tentando trazer pessoas bem alinhadas a nossa cultura. Atingimos o nosso primeiro bilhão em 2016.
Depois de cinco anos, a gente vem investindo dessa forma gradativa em equipe. Montamos também uma área de bolsa bottom-up, de análise fundamentalista, porque até então operávamos bolsa com viés top-down. Essa área de bolsa montamos uma terceira estratégia para um fundo de equity long based.
Então, depois de cinco anos consolidada, abrimos a terceira estratégia e dos nove que começaram em 2013, agora somos 25 pessoas com R$ 14,2 bilhões sob gestão.
-Como estão divididos esses R$ 14,2 bilhões?
Cerca de R$ 11,5 bilhões em estratégias macro, cerca de R$ 2,5 bilhões em estratégia de arbitragem, já fechadas para captação, e algo como R$ 280 milhões para a estratégia long biased.
Acaba que temos um produto, no macro, que pode ganhar dinheiro em diversos momentos de mercado. Como já temos um tempo, em anos de 2013 e 2014, por exemplo, o fundo performou bem no bear market. Quando foi bull market, como 2017 e 2018, também performamos bem e isso não está pendurado nos juros como é o mercado brasileiro até hoje.
[Esse fundo] ganha dinheiro em moeda, ganha em bolsas. Ele é bem diversificado e também muito agnóstico em relação a direção. Isso é fruto de não ser uma pessoa só. Quando o fundo é gerido por uma só pessoa, ela está sujeita aos mesmos vícios e gostos. Aquele mesmo instrumental e mesma forma de reagir aos eventos, mesmo com a evolução e aquisição de novas habilidades.
-Dos R$ 14 bi sob gestão, qual é fundo o principal?
É o Vertex, que é o fundo macro mais agressivo.
-Me explica um pouco melhor essa agressividade, por favor.
O mandato de risco determinado para o produto é maior que os demais. É uma estratégia de ter gestores, cada um responsável por mercados chaves, que eu comento com uma equipe multidisciplinar que tem de fato risco alocado no fundo, com mandatos e expertises diferentes.
A forma que a gente funciona, não somos nenhuma colcha de retalho de traders, onde cada um faz o que quiser. Mas também não é um fundo que só funciona sob consenso. Cada gestor tem um limite de risco, o grau de liberdade é alto, mas existe a figura do portfólio manager, que soma os riscos, aderência ao cenário base, então é alguém que pode aumentar e diminuir risco entre os gestores.
No processo de construção de portfólio, nossa ideia é que as ideias sejam debatidas, mas que,em hipótese alguma, existam posições que não sejam proprietárias ou alocadas no grupo de alguém.
-É esse modelo de gestão o diferencial de vocês para os demais fundos?
Hoje conseguimos mostrar resultados e não especular como conseguimos ser melhores [que os concorrentes].
Christian Faricelli: 0 principal diferencial de qualquer empresa nesse setor é o modo que a empresa consegue atrair pessoas e reter talentos.
Os fundos pensam no cliente, em retornos favoráveis, e o modelo dá liberdade aos gestores individualmente. Por exemplo, cada um tem o seu book com uma gestão delegada. Dentro dos multimercados, podemos fazer e tomar posições sem precisar de autorização, obviamente respeitando os níveis de risco.
Se lá dentro do meu risco eu tenho uma posição que eu gosto muito, dentro do meu limite de risco e de liquidez, mas como é uma estratégia dentro de várias, essa estratégia não vai fazer o fundo como um todo ir dentro ou ir mal. Eu levo essa opinião para os demais gestores e, caso eles concordarem, o fundo pode comprar uma posição maior para maximizar o principal call de todas as horas.
No segundo semestre do ano passado, tínhamos uma call forte de Petrobras. Achamos que, para o fundo, era pequeno. Chamamos todos os gestores, eles gostaram e aí colocamos uma posição maior do fundo.
-Como vocês veem a recuperação da economia neste ano e qual a perspectiva para o cenário macro?
Acho que primeira coisa, não podemos esquecer que fazemos parte do mundo. Temos uma posição relevante fora do Brasil, temos estrategistas, economistas, e assim olhamos dentro de um todo. Resumidamente, a nossa cabeça interna é bem otimista, sendo que o principal risco é uma inflação subindo, mas enxergamos como um risco baixo disso acontecer.
Lá fora, o último ciclo de crescimento não foi de exageros. Então o consumidor americano não está superendividado, o balanço das empresas não está superendividado, então não é um ciclo como foi o subprime lá atrás.
Outra coisa: os BCs estão preocupados com recessão há três anos. Então confiamos neles. A era de juros baixos é bom para ativos reais e bolsa são ativos reais.
-Nem guerra comercial assusta vocês?
O principal risco de guerra comercial é ter uma inflação no preço dos ativos porque a globalização é um dos motivos de a inflação estar bem baixa. Obviamente assusta, a gente se preocupa muito, mas a gente acha que está controlada e o melhor para todo mundo é não ter nada mais forte nessa guerra.
Tiago Sant’Anna: agora está mais fácil de falar né, mas nós tínhamos essa mesma visão há mais de dois meses atrás. O mercado estava com uma visão de continuidade, de escalada infinita de retaliações, e a gente tinha uma visão que o pragmatismo ia prevalecer. O impacto dessa economia se torna óbvio, e que poderíamos estar com a economia namorando uma recessão e a retórica precisaria ser mudada.
A gente já vinha carregando posições em bolsa antes dessa retórica ganhar contornos muito mais moderados. Outra coisa que gostamos muito de usar no processo de investimento é casar fundamento com técnico de mercado.
Fazemos um dever de casa muito extenso na parte de fundamentos, mas vemos também onde estão os consensos, os fluxos, o que o mercado já precificou. O santo graal é quando você encontra um fundamento que ainda não está refletido nos preços.
Obviamente isso não acontece a toda hora e, enquanto não aparece, ficamos mais leves esperando essa oportunidade aparecer. Estamos já há algum tempo com posições otimistas em bolsa, mesmo sendo difícil precisar quando essa guerra comercial dará um tempo, mas o cenário foi indo em nossa direção. O grande risco, na nossa visão, é aparecer inflação, mas é algo que não vemos o risco de aparecer, ao menos no curto prazo, na economia americana.
Sem inflação, o FED não sobe juros e ainda tem um espaço para mais cortes. Para subir juros, o FED precisa de uma inflação alta e persistente. Com os juros baixos e uma certa calmaria geopolítica, a gente acha que podemos ter de novo uma inflação de ativos, indo para os ativos americanos.
Christian Faricelli: a gente acha que, no Brasil, teremos juros baixos pelos próximos três ou quatro anos pela inflação baixa e questão conjuntural. As reformas que o governo tem feito traz a possibilidade para esses juros serem menores. Tem muita coisa para ser feito, o que foi feito é muito importante, mas não o suficiente para que o país tenha estruturalmente um juro menor, mas achamos que tem várias medidas traduzidas nesse sentido.
-Quais seriam essas medidas, por exemplo?
A reforma da Previdência de estados e municípios, reforma tributária, enxugamento ainda maior do BNDES. Temos muita reforma micro para ser feita. A dúvida é se vamos conseguir transformar esse cenário conjuntural em estrutural.
Se o Brasil virar um país de juros baixos realmente, daí achamos que está tudo muito barato no Brasil. Tanto taxa de juros, apartamentos, bolsa, tudo. Hoje, temos essa dúvida. Estamos caminhando e tem uma chance de termos um quadro positivo, mas para acontecer isso, temos uma possibilidade real e algo super otimista para o Brasil.
Voltando ao ponto de PIB. Primeiro, de forma bem genérica, nossa bolsa ela tem um terço de commoditie, independente de PIB, que é taxa de câmbio, quanto mais apreciado o dólar melhor, e China. Então isso é mais importante que economia doméstica.
O outro terço da Bolsa são bancos. Para bancos, o que importa principalmente é risco Brasil e isso depende muito mais da questão fiscal, mercado externo e risco Brasil. E outra é rentabilidade do banco, que hoje depende muito mais das fintechs comendo rentabilidade, do que de outra coisa.
Então o PIB não ajuda? Obvio que ajuda, mas crédito já está crescendo. Eu diria que PIB é importante, mas em grau de importância é o terceiro item. O primeiro é risco Brasil, o segundo é competição de bancos e terceiro crescimento do PIB.
No terço doméstico, temos várias coisas no meio. Tem ferrovias e telecomunicações, por exemplo. Esses setores dependem muito mais de taxa de juros Brasil do que de PIB. Só na faixa de consumo você precisa de PIB.
-Tem gente aumentando a exposição em varejistas, por exemplo, baseado nisso. Para vocês não é tão relevante?
Acho que eles estão concentrando as apostas dele nesses 20% da bolsa, que são sensíveis a PIB. O jeito que olhamos aqui é diferente. Achamos que, nessa parte da Bolsa, tem alguns valuations muito caros e, como somos muito sensíveis a preço, não compramos.
Um exemplo é o setor de construção civil. É um setor que, com os valuations atuais, a gente não gosta. Achamos que está caro por N fatores. Até acho que construção civil no País vai bombar, só que a gente acha que tem preço. Para comprar terreno hoje já é uma briga de foice. Não é porque o setor vai bombar que vamos para home builder.
-Qual setor vocês estão aumentando exposição?
Nossa carteira é super diversificada. Temos posições em praticamente todos os setores da Bolsa. Tem uma parte em commodities. Gostamos de Vale, Petro, Gerdau, gostamos de PetroRio, a gente está aumentando proteínas também.
Bancos foi um setor que tínhamos uma exposição super pequena, mas carregamos BTG há bastante tempo. Compramos bancões há dois meses porque achamos que o valuation estava bom. Dentro do varejo, na média, achamos as coisas caras. A empresa que está no céu de brigadeiro, sem competição, a gente não gosta.
Na parte de regulados, temos bastante utilities na carteira desde o começo do ano. Também temos um pouco de saneamento, um pouco de elétricas e temos Rail, que gostamos bastante, há bastante tempo.
Setor de saúde tem o macro bastante favorável, algumas achamos bastante caras, e gostamos de outras.
-Vocês estão aumentando exposição de proteínas. Justamente pelo problema chinês?
O problema chinês ajuda muito e é o principal driver do setor. E temos exposição em offshore também, como Facebook, para ficar fora do Brasil. Também temos uma parte que fazemos short, direcional comprada, direcional vendida, e também uma long and short.
Olhamos o portfólio como um todo. E temos mais de 40 empresas na carteira, é um portfólio bem grande e diversificado.
-Na exposição do exterior, há algum ativo específico?
Moedas e operamos bastante nos EUA porque conhecemos, confiamos nas instituições, olhamos de perto, mas estamos sempre procurando oportunidades. Fizemos um trade no México que foi ótimo e é um país onde não carregamos posição, mas vimos que era uma ótima oportunidade para aproveitarmos.
-Qual foi a oportunidade?
Tiago Sant’Anna: gostamos de aplicar juros lá. Nos fundos, estamos comprados aqui e no S&P, aplicados no Brasil em juros reais e estamos um pouco mais leve em moedas.