O longo prazo sempre chega
De acordo com a mitologia grega, Sísifo era um homem muito inteligente, que ousou desafiar os deuses repetidas vezes e conseguiu evitar as consequentes punições, sempre devido à sua grande astúcia. Entretanto, como a vida dos mortais não é para sempre, Sísifo um dia morreu e não teve como fugir do doloroso castigo eterno.
A falta de habilidade do homo sapiens em lidar com a ideia de longo prazo, mesmo que seja antes da morte, é bem documentada pela literatura comportamental. Podemos facilmente identificar atitudes cotidianas que se mostram danosas após a passagem de certo tempo. Será que vale a pena gastar anos de juventude estudando para conseguir um diploma sem garantia de vida melhor ao final do ciclo? Economizar uma parte do salário em detrimento da diversão merecida pelas horas de suor? Gastar menos hoje para ter uma aposentadoria tranquila?
Talvez seja melhor deixar os problemas do futuro para as pessoas do futuro e esperar algum golpe de sorte que fará tudo se resolver no final. Toda semana há alguém que ganha na loteria.
A história do capitalismo é repleta de promessas de enriquecimento rápido, muitas vezes atreladas ao investimento em ativos da moda, que já foram tulipas, empresas de internet e criptomoedas, para citar poucos exemplos. A formação de bolhas especulativas, motivadas pela ganância e pela irracionalidade do mercado, é efeito que ocorre com frequência. Ganhos extraordinários de fato ocorrem, porém na maioria das vezes causados por eventos que fogem ao nosso controle ou previsão. Vieses cognitivos fazem sua parte ao criar cenários que nos colocam como agentes influenciadores do que na verdade foi apenas sorte, nos deixando completamente iludidos pelo acaso ao crer que o raio pode cair no mesmo lugar. Resultado: prejuízo a muitos dos que colocaram seu dinheiro a serviço das promessas de curto prazo.
Como o leitor um pouco mais experiente já deve estar pensando, ser racional e exaustivo o tempo todo tampouco é garantia de sucesso. Por vezes tomamos decisões que se se mostram equivocadas em qualquer horizonte de tempo analisado, como o investidor brasileiro com alguns anos de vivência no mercado pode testemunhar. Saber que erros são parte da vida e que inevitavelmente acontecerão é um trunfo do pensamento racional de longo prazo. A autocrítica sincera é uma virtude subestimada na construção do pensamento individual. Ao ir além das explicações fáceis para nossos próprios erros (geralmente a culpa é terceirizada, para satisfação do pensamento negligente de curto prazo), ganhamos em repertório e em conhecimento para não os cometer novamente. Lembro do monge William de Baskerville, personagem de Umberto Eco, que, ao ser questionado se cometia erros, respondeu: “Frequentemente. Mas, em vez de conceber um só, imagino muitos, assim não me torno escravo de nenhum.”
Há quem argumente que Sísifo não necessariamente se arrepende de seus atos em vida enquanto carrega a pedra repetidamente morro acima. Talvez tenha feito tudo de caso pensado, sabendo que a pena sofrida era um dos desfechos possíveis e optou pelas transgressões mesmo assim, simbolizando seu desprezo aos deuses e a paixão pela vida. Com arrependimento ou não, podemos ter certeza de que o dia de pagar a conta chegará. E é melhor que a pedra seja leve.
Esta matéria foi escrita pelo time da Suno Consultoria. Para conhecer melhor este serviço da Suno, clique aqui