Dividendos nem sempre são líquidos e certos como complemento de renda; entenda
É possível ter renda líquida e certa apenas com dividendos pagos por ações? A resposta é sim, mas depende muito da necessidade de recurso de cada pessoa ao longo do mês. Até porque, como regra, dividendos de ações, por exemplo, não são pagos, necessariamente, todo mês. No geral, o pagamento é feito trimestral, semestral ou anualmente. Há bancos que costumam distribuir dividendos todo mês, mas ninguém deve montar uma carteira só com ações de bancos, para evitar o risco.
Por isso, aqueles que precisam de dinheiro na conta com regularidade, contando com dividendos, têm de se organizar muito bem para não ter surpresas que podem atrapalhar o planejamento financeiro.
Contar com um dinheirinho caindo na conta corrente todo mês não é nada mal. Renda extra é sempre bem-vinda, ainda mais isenta de impostos. Porém, não se trata, necessariamente, de uma renda adicional com a qual se pode contar sempre. Até porque dividendos podem variar de empresa para empresa, de acordo com inúmeros circunstâncias. Uma boa pagadora de dividendo hoje, pode não ser amanhã.
“É possível ter uma previsibilidade na renda a receber via dividendos – no entanto, é importante saber que isso pode depender de alguns fatores”, argumenta o gestor de renda variável da Inter Asset, Rafael Cota Maciel. Segundo ele, variações macroeconômicas desfavoráveis (dados de inflação, juros, câmbio, por exemplo) podem comprometer os resultados das empresas e conter a distribuição de dividendos. Outras situações inesperadas, como a pandemia da Covid-19, afetam a economia e os mercados como um todo.
As ações estão entre as principais classes de ativos que remuneram seus investidores, por meio de dividendos, juros sobre capital próprio e recompra de ações. Os fundos imobiliários (FIIs), por sua vez, estão obrigados a distribuir 95% do lucro líquido aos seus cotistas.
Mais regulares na distribuição de lucros, o sucesso dos FIIs tem sido muito grande pelo fato de um de seus principais atrativos ser justamente a remuneração mensal ao investidor, oferecida pela maioria dos fundos, embora a obrigação por lei seja a distribuição semestral de lucro.
Alguns títulos do Tesouro Direto também garantem renda regular com o pagamento de juros semestrais. Os chamados cupons remuneram o investidor a cada seis meses com o rendimento proporcional ao valor e ao tempo da aplicação no Tesouro IPCA+ e Tesouro Prefixado.
Para Idean Alves, sócio e chefe da mesa de operações da Ação Brasil Investimentos, é possível sim “viver de renda”, usando o fluxo dos dividendos. “Com base no histórico de pagamento dos ativos, sejam ações ou fundos imobiliários, tendo-se em vista quanto e quando cada ativo pode pagar, é possível estabelecer uma programação que case com os seus custos fixos mensais”, garante o gestor.
Alves diz que, casando as ações que pagam dividendos com os fundos imobiliários que têm um fluxo mensal médio previsível, é possível planejar-se para que esses recursos extras paguem os custos mensais.
A desvantagem, segundo Alves, é ficar exposto à renda variável e a ajustes de posições abruptas na carteira, com as oscilações de mercado. “Outro fator negativo é ocorrer uma grande mudança no mercado que leve à revisão do pagamento de dividendos, caso da pandemia.”
Empresas que distribuem dividendos normalmente não precisam investir grandes somas na sua operação e no seu crescimento. Com bom controle e eficiente geração de caixa operacional, além de endividamento sob controle, há menor volatilidade e maior propensão à distribuição de boa parcela dos lucros aos acionistas. “Porém, esse tipo de empresa tem menor probabilidade de crescimento, uma vez que deixa de investir no crescimento do negócio para remunerar o acionista”, destaca Maciel, da Inter Asset.
No mercado, o percentual do lucro líquido distribuído por meio de dividendos de ações fica em torno dos 25%, limite mínimo obrigatório por lei. Mas pode chegar a 50% do lucro, de acordo com a Lei das Sociedades Anônimas, caso a empresa não defina no estatuto qual fatia do lucro pretende distribuir.
Bons de dividendos
Companhias dos setores financeiro (bancos e seguradoras), de energia elétrica, de saneamento, concessionárias de rodovias e de commodities (mineração, celulose e petróleo) estão entre aquelas que distribuem mais dividendos. Segundo os especialistas, uma boa maneira de garimpar pagadoras de dividendos é pesquisar junto às áreas de relações com investidores.
Os interessados na estratégia precisam analisar todo o histórico da empresa como pagadora de dividendos. O mais importante é procurar saber se existe realmente regularidade na distribuição de proventos aos acionistas, ou se os pagamentos são apenas esporádicos. Pode parecer óbvio, mas empresas que têm prejuízos não pagam dividendos. Aquelas que registram baixa lucratividade costumam distribuir valores muito baixos de dividendos.
Dividendos: Veja as cinco favoritas do Itaú BBA para 2023
O Itaú BBA publicou em outubro relatório revisando sua carteira recomendada de dividendos, com a inclusão das ações da B3 (B3SA3) no portfólio.
Anteriormente, na carteira de dividendos do BBA, estava o Bradesco (BBDC4), que saiu nesta revisão – após diversas quedas no Ibovespa.
“Passados quase quatro meses, ainda vemos tendências negativas para o banco, com inadimplência ainda em alta, deterioração da carteira de pequenas e médias empresas e impactos negativos na divisão de seguros (sinistralidade em alta)”, dizem os analistas sobre a retirada dos papéis BBDC4.
Sobre a nova empresa no portfólio, o BBA destaca múltiplos descontados e uma projeção de dividend yield otimista para o ano que vem.
“Do lado operacional, o aumento de receitas e o maior controle de custos devem expandir a margem Ebitda (rentabilidade operacional) da B3 em mais de 1p.p. em 2023 (atingindo 75,5% no consolidado do ano)”, dizem os especialistas.
Segundo dados do Status Invest, a ação B3SA3 é negociada hoje a 16x o preço por ação em relação ao lucro por ação (P/L), o que representa um desconto de 25% no comparativo com a média histórica, de 21x.
Já no comparativo com pares globais, a bolsa de valores brasileira negocia com cerca de 24% de desconto.
Confira a carteira do Itaú BBA
- B3 (B3SA3) – 6,20% de DY projetado para 2023
- Vibra Energia (VBBR3) – DY não revelado
- CPFL (CPFE3) – 11,60% de DY projetado para 2023
- Copasa (CSMG3) – 12,80% de DY projetado para 2023
- Marcopolo (POMO4) – 7,20% de DY projetado para 2023
Veja as 5 ações que mais pagaram dividendos nos últimos 12 meses
Seguindo o ciclo de dividendos polpudos de 2021, quando a Petrobras (PETR4) e a Vale (VALE3) distribuíram sozinhas mais proventos do que todo o restante da Bolsa, o ano de 2022 tem mantido o caixa das companhias abertas na mão dos acionistas, com diversas empresas pagando altos proventos em relação às suas cotações.
Levantamos cinco pagadoras de dividendos que possuem os maiores dividend yields (DY) da Bolsa brasileira durante os últimos 12 meses. Os dados são da plataforma do Status Invest, atualizados no início deste mês de outubro.
O yield, ou DY, é o indicador que mostra quanto um ativo pagou em proventos nos últimos 12 meses em relação às suas cotações atuais.
- Petrobras (PETR4): 61,3% de DY
- Braskem (BRKM5): 28,6% de DY
- Bradespar (BRAP4): 29,8% de DY
- Marfrig (MRFG3): 22,6% de DY
- Gerdau Metalúrgica (GOAU4): 25,3% de DY
Após um ano de 2021 com retornos altos em ações pagadoras de dividendos, analistas da XP Investimentos apontam que o momento atual ainda é propício para esse tipo de ativo.
“Acreditamos que investimentos em Bolsa continuam oferecendo boas oportunidades no cenário atual. Em particular, ações pagadoras de dividendos seguem sendo atrativas olhando para seus ganhos acumulados ao longo do tempo”, dizem os especialistas Fernando Ferreira, Jennie Li e Rebecca Nossig.
Gastar ou reinvestir
Ao receber os proventos relativos à distribuição de lucro, o que fazer com o dinheiro, caso haja sobra em relação às necessidades financeiras? Muitos reinvestem os recursos nas próprias ações, reforçando suas posições. “Mas, se o investidor reinveste o dividendo, não seria melhor que a empresa, em vez de pagar o provento, investisse na valorização do patrimônio?”, indaga João Beck, economista e sócio da BRA.
Beck defende o que ele chama de “renda sintética”. Em vez de montar uma carteira com empresas pagadoras de dividendos, ele sugere investir em ações de boas empresas. “E, se precisar de algum recurso, pode ir lá e realizar lucro, fazendo uma renda sintética; vendendo um pouquinho de cada ação”, explica. Segundo ele, pode ficar até mais prático, vendendo exatamente no montante do que vai precisa para gastar naquele determinado mês. Ele lembra, no entanto, que essa estratégia vale para valores abaixo de R$ 20 mil, isentos nas operações de venda de ações.
“Quando o investidor recebe dividendos, nem sempre é na exata proporção que ele precisa para consumir. Às vezes, recebe menos, ou a mais, e o dinheiro fica parado no caixa”, ressalta. Segundo ele, essa é uma observação importante para quem está montando carteira de dividendos.
Texto e reportagem: José Carlos Videira