Como a deflação impacta a renda fixa?
As últimas divulgações do IPCA, referentes aos meses de julho e agosto, registraram deflação. As leituras em campo negativo (-0,68% m/m e -0,36% m/m, respectivamente) refletiram sobretudo as desonerações tributárias em energia e combustíveis e as reduções de preço promovidas pela Petrobras (PETR4).
Para relembrar, em junho o governo aprovou o PL 18/2022, convertido em LC 194/22, que reduziu o ICMS em caráter permanente e zerou até o final deste ano a tributação de PIS/Cofins de combustíveis. Ademais, a Petrobras anunciou, em julho, o início do corte nos preços dos combustíveis. Desconsiderando os efeitos de tais medidas, a inflação continuaria registrando variação positiva.
Apesar da leitura do IPCA em agosto em território negativo, a composição apresentou deterioração na abertura do índice, devido principalmente à aceleração da média dos núcleos e avanço dos indicadores de difusão – percentual de itens com aumento de preços. Além disso, os principais catalisadores baixistas permaneceram em itens voláteis, como combustíveis e alimentos, e serviços permanecem em alta.
É verdade que a leitura do IPCA em setembro provavelmente também será negativa. Mas, assim como as revisões baixistas para a inflação projetada em 2022, o cenário inflacionário continua preocupante. O presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, advertiu recentemente que a inflação ainda apresenta características que inspiram cuidados. Alertou também que “vamos passar por três meses de deflação, mas a batalha não está ganha”. Bruno Serra, diretor de política monetária, também recomendou cautela.
Os riscos altistas do balanço, como os custos elevados, as condições climáticas e questões geopolíticas, comprimem o potencial de quedas grandes o suficiente conduzirem a inflação ao consumidor ao campo negativo após setembro.
Impactos na renda fixa
A correção mensal da inflação reflete nos títulos atrelados ao IPCA, quase sempre positivamente. Mas, quando o índice registra uma deflação, o rendimento final do ativo indexado ao IPCA é reduzido devido à correção negativa do Valor Nominal Atualizado.
Para o Tesouro IPCA+, por exemplo, o VNA era de R$ 1.000,00 em sua data base (15/07/2000). Desde então, ele é atualizado conforme a evolução do indexador. Assim, a variação do VNA entre duas datas indica qual foi a variação da inflação no período. O VNA facilita o acompanhamento da evolução do indexador.
Uma das variáveis que compõem o cálculo de preço do ativo é o Valor Nominal Atualizado. Ou seja, leituras negativas do IPCA reduzem o preço do título justamente porque impactam o VNA negativamente.
E agora, o que fazer?
A despeito das revisões baixistas para o IPCA em 2022, devido à desoneração fiscal e redução de preço dos combustíveis, a inflação corrente permanece elevada e apresentou deterioração recentemente, fato este que corrobora a importância da classe nos portfólios.
É comum observar movimento de aversão aos ativos indexados ao IPCA por parte dos investidores em momentos em que os preços dos títulos se desvalorizam – movimento, em minha visão, muitas vezes equivocado.
A justificativa da queda nos preços parece passageira e a deflação atual tem natureza de curto prazo. Somando ainda os níveis atuais de taxas de juros reais, os títulos IPCA+ continuam sendo bons investimentos, principalmente para prazos médios e longos.