Inflação causa temor em ano de eleições, diz economista
O histórico de inflação elevada no Brasil ainda levanta preocupações, sobretudo em um ano de eleições. Mesmo assim, o sinal de deflação é motivo de comemoração para economistas.
Isso porque o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) apresentou uma retração de 0,68% no mês de julho. Trata-se da menor taxa mensal já registrada desde o início da série histórica em 1980, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
O economista-chefe da MB Associados, Sérgio Vale, associa essa deflação registrada em julho à desoneração de impostos por parte do governo federal, em medida do presidente Jair Bolsonaro (PL), com as eleições no radar. A decisão teve como consequência a diminuição nos preços dos combustíveis.
Em 19 de julho, a Petrobras (PETR4) anunciou a primeira queda no preço da gasolina, de 4,9%. Na semana seguinte, a medida se repetiu, desta vez em recuo de 3,8%.
“Sabemos que a deflação foi causada de uma forma artificial, com um corte temporário de impostos neste ano, que provavelmente veremos a reversão no ano que vem. Parte desses impostos cortados para 2022 são transitórios, só valem até o fim do ano. A alta provavelmente ficará concentrada em janeiro, isso se não for revertido já no final deste ano. Com uma eleição no meio do caminho, pode ser rediscutido”, explica o economista, evidenciando a volatilidade do cenário eleitoral.
Cenário fiscal é importante para pós-eleições
Com novos incentivos sociais criados pelo governo, com a PEC dos Auxílios, o mercado ficou mais atento ao cenário fiscal local. Além de ser uma questão para o governo eleito em questão de 75 dias, pode ser um fator prejudicial para a taxa de câmbio e a política monetária do Brasil.
“Com ingerência do governo nas finanças estaduais, há um risco muito grande para os próximos anos. O cenário fiscal pode começar a afetar a taxa de câmbio, como vimos nas últimas semanas. O risco fiscal gera pressão na taxa de câmbio por conta da reversão dos impostos que foram cortados esse ano”, diz o economista Sérgio Vale.
O governo brasileiro age na contramão da política monetária do Banco Central do Brasil (BC). Enquanto a autoridade provocou mais de 10 elevações consecutivas da taxa de juros, em esforços de aperto, para conter a escalada da inflação, cerca de R$ 41,25 bilhões do orçamento serão utilizados para a expansão do Auxílio Brasil, que passa a ter valor mínimo de R$ 600 para cada família, e do Auxílio Gás, além da criação de auxílios a caminhoneiros e taxistas pelo aumento do preço dos combustíveis.
“Se a política fiscal não tivesse sido tão expansionista nessa modalidade, como está acontecendo desde o início do ano, talvez o BC poderia ter sido menos agressivo com os juros”, aponta.
BC deverá ser o “adulto” na economia
Na visão de Sérgio Vale, o Banco Central está sozinho nas ações de aperto monetário. “Com a pandemia, o governo não parou para pensar em quais estratégias vai utilizar, de acordo com a política econômica que quer colocar em prática. Pensando nas ações recentes, de benefícios sociais, pensar em um auxílio para a população de baixa renda faz mais sentido do que um corte localizado de impostos em um segmento. Não foram só os combustíveis ou a energia que subiram. Tivemos um aumento sistemático de diversos preços.”
Para o economista, a melhor cartada do governo, diante da crise que assusta não só o Brasil mas o mundo, seria proteger a população mais pobre, em vez de cortar um imposto específico.
“Desde o início o governo deveria ter focado em dar renda e não insistir na questão tributária, como foi feito, atrapalhando os estados ano que vem e forçando uma deflação artificial. O governo quis atirar para todos os lados, do ponto de vista eleitoral”, apontou.
No quesito da política monetária, o tom do Banco Central dá a sensação de que a autoridade, mais do que no ano passado, está apreensiva com o que vem pela frente.
“Em um cenário tão turvo como o enfrentado agora, o BC terá de ser ‘o adulto’ na sala e colocar a taxa de juros em um patamar elevado. Ele tem muitas incertezas, com eleições no radar, a possibilidade de um cenário recessivo lá fora, e as mudanças na política e fiscal”, explica Vale.