O esporte deixou de ser, há décadas, uma atividade física auxiliar no desenvolvimento da saúde de seus praticantes para ser parte da indústria global do entretenimento. Esportistas de destaque rivalizam com estrelas de cinema na arrecadação de cachês milionários e na renda obtida com patrocinadores. Em muitos casos, ídolos são fabricados com o propósito de divulgar marcas e produtos de consumo, movimentando bilhões de dólares ao ano.
Os gestores dos esportes mais populares do mundo sabem que a paixão que atletas, times, seleções nacionais e clubes despertam em milhões de espectadores é um poderoso ativo cujo valor, muitas vezes, é intangível.
A beleza do esporte resulta cristalina quando suplanta as paixões clubísticas ou nacionalistas, quando torcedores de times rivais são capazes de admirar a atitude de membros da equipe adversária. Na Copa do Mundo de Futebol da Espanha em 1982, por exemplo, a seleção da Itália eliminou o time do Brasil e sagrou-se campeã do mundo – isso não impede que os italianos admirem jogadores como Falcão e Zico até hoje.
Muito do romantismo das práticas esportivas se perdeu com desenvolvimento do marketing em torno das transmissões dos eventos em diversas mídias – fato que não apaga a importância de alguns princípios que ainda persistem nas disputas, onde os atletas e suas equipes se convertem em fonte de inspiração para profissionais de diversas áreas, especialmente entre empreendedores e investidores.
Os atletas – principalmente de modalidades olímpicas – têm muito a nos ensinar, não apenas quando sobem no pódio para receber uma medalha, mas especialmente quando são derrotados e, na primeira entrevista, se mostram dispostos a melhorar seu desempenho na próxima competição.
Vejamos, a seguir o que os esportistas podem demonstrar para investidores alertas.
DISCIPLINA
Foi o tempo em que apenas o talento resolvia uma disputa esportiva. Atletas que não se empenham nos treinamentos dificilmente terão uma longa carreira – vide os antigos craques do futebol brasileiro que sucumbiram aos prazeres da bebida e da noite em detrimento da disposição para aprimoramentos técnicos em treinos diários.
O exemplo oposto é o tenista Roger Federer. Aos 36 anos de idade, o suíço tornou-se o homem mais velho a figurar na primeira colocação do ranking da ATP, depois de atingir tal posto ainda com 22 anos incompletos, em janeiro de 2004. Ocorre que Federer treina diariamente desde os oito anos de idade – uma impressionante carreira de quase três décadas no esporte.
A rotina de um atleta vencedor como Federer é composta por alguns regramentos, sacrifícios e abstenções: deve-se tomar cuidado com a dieta, evitando certos tipos de alimentos, manter-se longe dos vícios, dormir nos horários estipulados, abrir mão de férias prolongadas e atividades de risco. Certas seguradoras proíbem atletas contratados de praticar atividades radicais, como voar de paraglider.
Igualmente o cotidiano de um investidor, ainda em começo de trajetória, é temperado com algumas privações. É preciso ter disciplina para viver num padrão de consumo abaixo daquele proporcionado pela renda mensal. Só desta maneira o investidor terá capacidade de fazer poupança para aplicar o excedente no mercado financeiro. Investidores convictos não tiram períodos sabáticos e não são afeitos a hobbies dispendiosos.
A disciplina, tanto do esportista como do investidor, também é responsável pelo respeito a uma estratégia vencedora a ser adotada. E nem sempre essa estratégia é a mais vistosa ou atraente.
Para Bernardinho – o maior vencedor da história do vôlei mundial, tendo dirigido as seleções masculina e feminina do Brasil em vários jogos olímpicos, amealhando sete medalhas em nove participações, como jogador e técnico – “a distância entre o sonho e a realidade chama-se disciplina”.
Bernardo Rezende sempre priorizou o poder da equipe sobre o talento individual dos jogadores. Aqueles que não aceitavam submeter-se ao padrão de jogo projetado pelo técnico, por mais talentosos que fossem, eram cortados de seus times.
No mercado financeiro, muitos relutam em seguir uma estratégia baseada em dividendos, através de ativos escolhidos com os princípios do Value Investing. A famosa estratégia baseada no slogan “comprar na baixa e vender na alta” parece mais eficaz quando as bolsas estão num ciclo de valorização.
A estratégia dos dividendos é considerada defensiva. Adotá-la é como jogar na retranca para explorar os contra-ataques, quando a bolsa cai e as boas ações ficam mais baratas, por exemplo. Não é uma tática chamativa e glamourosa, mas é um procedimento vencedor, que permite a investidores aplicados ter resultados melhores do que os obtidos por especuladores performáticos.
Portanto, para manter-se fiel à estratégia dos dividendos, que dão retornos substanciosos apenas no longo prazo, é preciso ter a disciplina de um atleta devoto de um mestre. No Brasil, nós temos um grande mestre: Luiz Barsi Filho. Investidores que abandonam tal estratégia no meio do caminho ficam justamente no acostamento a espera de socorro.
PACIÊNCIA
Nenhuma torcida no mundo teve mais paciência para ver seu time campeão do que a torcida do Chicago Cubs, da Major League Baseball. Os “adoráveis perdedores” – apelido dado pelos torcedores rivais – ganharam a Word Series em 1907 e 1908. Desde então, eles ficaram na fila que parecia interminável: só venceram o terceiro campeonato em 2016.
A popularidade dos Cubs não diminuiu com a falta de títulos. Ao contrário: ela veio aumentando a cada ano sem, no entanto, ser um caso isolado. Clubes brasileiros de futebol, como Botafogo, Corinthians e Palmeiras, já ficaram em torno de vinte anos sem ganhar um campeonato, mas suas torcidas seguem entre as mais numerosas do país.
Junto com a torcida, estas equipes atraem fornecedores de material esportivo e patrocinadores, que colocam recursos nos times mesmo sabendo da dificuldade de vencer o campeonato no final da temporada.
De modo semelhante deve se comportar um investidor de longo prazo. É preciso cultivar a paciência para realizar aportes durante vários anos antes de passar a usufruir das primeiras retiradas para o custeio da plena aposentadoria. A vantagem do investidor é que ele não precisa ser declarado um campeão, levantar um troféu e dar uma volta olímpica, uma vez que ele não compete com outros, senão com as próprias tentações de levar seu dinheiro para fins alheios.
PERSEVERANÇA
Maurren Higa Maggi é o maior nome feminino do atletismo brasileiro. Saltadora e velocista, ela iniciou sua carreira profissional em 1996, curiosamente na equipe que era mantida com o patrocínio da BM&F de São Paulo, recentemente descontinuada pela B3.
Após conquistar a medalha de ouro no salto em distância dos jogos pan-americanos de Winnipeg em 1999, ela chegou aos jogos olímpicos de Sidney, no ano seguinte, entre as favoritas. No entanto, ela se machucou ainda na primeira fase da competição, deixando prematuramente a disputa.
Desde então, Maggi passou a treinar com o foco nos jogos olímpicos de Atenas, que seriam disputados quatro anos depois. Em 2003, porém, a atleta foi acusada de doping, que apesar de comprovadamente involuntário, resultou numa punição que a afastou das competições oficiais. O retorno ao esporte se deu em 2006, motivado pelo nascimento da filha Sophia, por quem Maggi se dispôs a garantir um futuro melhor.
Nos jogos olímpicos de Pequim, em 2008, aos 32 anos de idade e oito anos depois de sua primeira tentativa, finalmente Maurren tornou-se a primeira campeã olímpica brasileira num esporte individual.
A trajetória de Maggi pode ser comparada à de Lírio Parisotto, brasileiro investidor na Bolsa de São Paulo apontado como uma das pessoas mais ricas do mundo.
O sucesso nos investimentos nem sempre acompanhou o gaúcho de Nova Bassano. Pelo contrário, ele colheu prejuízos dramáticos em suas primeiras tentativas no mercado de capitais, num tempo onde era mais difícil conseguir informações sobre bons ativos.
Parisotto começou a investir com apenas 18 anos em 1971, quando as bolsas brasileiras (ainda havia a Bolsa do Rio) estavam num período de forte crescimento. Pouco tempo depois ele perdeu tudo, o valor equivalente a um carro popular, em função da derrocada ocorrida no mercado financeiro, comparada ao crash da Bolsa de Nova York em 1929.
Lírio voltou ao mercado em 1986, investindo 500 mil dólares. Como a sua empresa Videolar subitamente necessitou de recursos para capital de giro, Parisotto precisou vender as ações resgatando apenas 200 mil dólares.
Em 1991, finalmente com a mentalidade dos dividendos no foco, o investidor começou a colher bons retornos no mercado financeiro, ao comprar inicialmente ações da Eletrobrás. Perguntado por um jornalista do jornal “A Hora” quando foi seu ponto de virada, Parisotto respondeu:
“É tudo um processo que acontece ao longo do tempo. Não conheço quem aprenda com os acertos, mas sim e sempre com os erros. Sem mágica. A dica é, essencialmente, ter uma sede inesgotável de boa e qualificada informação, correr atrás dela sem cansaço ou certezas. Checar as fontes. Saber esperar também ajuda. Saber que não há 100% de certeza numa decisão, e por vezes nem metade disso. Investir sem informação é pecado capital. E jamais vender na baixa.”
REGULARIDADE
Quando pensamos em automobilismo, os grandes campeões da Fórmula 1 que vem em mente são Schumacher, Prost e Senna, entre outros. Eram pilotos extraordinários, sem dúvida, mas corriam por equipes de ponta, com carros claramente superiores na maioria das vezes. Por isso eles venceram campeonatos ganhando várias corridas por temporada.
Mas houve um tempo em que a Fórmula 1 era um esporte bem mais competitivo. Em 1982, quando a Itália foi campeã mundial de futebol jogando na retranca, o finlandês Keke Rosberg sagrou-se campeão da Fórmula 1 vencendo apenas um Grande Prêmio, correndo pela equipe Williams.
Rosberg não é lembrado entre os melhores do seu esporte. Então, como ele ganhou um campeonato? Num tempo onde apenas os seis primeiros colocados de cada corrida marcavam pontos, Keke chegou à zona de pontuação com notável regularidade. Num total de 15 Grandes Prêmios, ele chegou em segundo lugar três vezes, em terceiro lugar duas vezes, uma vez em quarto e três vezes em quinto, numa época em que os carros quebravam em demasia.
Podemos transpor seu desempenho para o mercado financeiro sob dois pontos de vista, o primeiro responde pela regularidade do investidor em fazer aportes: nem sempre é possível realizar compras volumosas através da bolsa, mas é importante estabelecer uma constância nas mesmas como, por exemplo, uma vez ao mês. Mesmo com uma renda comedida, é possível beliscar pontos que serão acumulados no final do certame.
Por outro lado, se comparamos Rosberg com uma empresa de capital aberto, veremos que ele não é campeão em vários indicadores fundamentais (Grandes Prêmios), mas ele tem boas posições em vários deles. A Engie Brasil, por exemplo, não é a empresa que mais distribui dividendos, seu P/L está entre os melhores sem ser o melhor, o mesmo valendo para seu ROIC e seu ROE, sua dívida é controlada e seu crescimento anual é razoável.
Não interprete isso como recomendação, mas no conjunto EGIE3 tem potencial para ser campeã no longo prazo por causa de um fator: assim como a Williams de Rosberg, ela dificilmente vai quebrar – o que nos faz lembrar uma frase célebre de outro piloto campeão, o ítalo-americano Mario Andretti: “Você não pode ganhar uma corrida na primeira volta, mas você pode perdê-la”.
O problema de jovens investidores ansiosos para enriquecerem rapidamente, é que eles podem bater ainda na primeira curva, logo depois da largada – basta operar excessivamente alavancado com opções ou mesmo com day trade. Um negócio mal sucedido pode arruinar todo o patrimônio do sujeito, o que nos leva ao último item da pauta.
RESISTÊNCIA
Investir não é como correr contra o jamaicano Usain Bolt nos 100 metros livres, onde tudo se decide em menos de dez segundos. Investir é como participar de uma maratona, onde mais importante que vencer é chegar ao seu final.
Não por acaso a maratona é a modalidade esportiva mais nobre, escolhida para encerrar cada edição dos modernos jogos olímpicos, idealizados pelo francês Pierre de Coubertin, marcado na história do esporte por suas palavras: “O que importa na vida não é tanto o triunfo, mas o combate; o essencial não é ter vencido, mas ter lutado bem.”
Se levarmos seu ideal para o mercado financeiro, podemos concluir que cada investidor tem a própria régua para medir sua capacidade de triunfar e, mais importante do que se comparar com os outros ao longo da jornada, é ter a consciência de que os investimentos estão sendo feitos com responsabilidade.
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