Dicas para melhorar sua análise de empresas – Parte III

Em continuidade às Partes I e II, hoje apresentarei a terceira dica que pode te ajudar a fundamentar melhor sua decisão de investimentos.

Na parte I, expliquei como conhecer o modelo de negócio e o funcionamento da operação de uma empresa é fundamental para analisá-la.

Na Parte II, apresentei alguns conceitos essenciais de contabilidade e três documentos importantíssimos na análise de uma empresa, são eles o Balanço Patrimonial (BP), a Demonstração do Resultado do Exercício (DRE) e a Demonstração dos Fluxos de Caixa (DFC).

Naquele momento, não tive espaço para explicar a diferença entre lucros e geração de caixa, deste modo, para esclarecer alguns pontos que ficaram em aberto na Parte II, apresentarei a terceira dica que te ajudará a fundamentar melhor suas decisões de investimento.

 

3) Lucro e geração de caixa são elementos distintos

Na Parte II, mencionei que “uma empresa pode ser extremamente lucrativa, sem gerar caixa, o que pode, inclusive, levar a mesma à falência.”

Creio que esse ponto pode ter gerado uma série de dúvidas ao leitor, portanto tentarei esclarecer a diferença entre lucro e geração de caixa.

Em se tratando de regime de competência, os lucros são contabilizados no momento do fato gerador. Mas o que significa isso?

Pense na seguinte situação. Você é um fabricante de máquinas agrícolas que vende produtos oferecendo um grande prazo de pagamento para seus clientes.

Você realizou uma venda no valor de quinhentos mil reais para um cliente no dia 10 de novembro de 2018 e combinou um prazo de pagamento de 1 ano, ou seja, seu cliente realizará o pagamento dos quinhentos mil reais no dia 10 de novembro de 2019.

Neste caso, a receita será contabilizada no momento de entrega da máquina, no dia 10 de novembro de 2018, entretanto, a sua empresa não recebeu o dinheiro nesta data.

Perceba que a entrada de caixa ocorrerá apenas no ano seguinte, mas os lucros já foram contabilizados em 2018.

Sua empresa teve uma série de custos e despesas para construir a máquina e teve de desembolsar cerca de trezentos mil reais em 2018 para possibilitar esta operação.

Vejamos como ficaria a DRE da empresa considerando apenas esta operação.

No campo das receitas, teríamos quinhentos mil reais. Os custos e despesas totalizaram trezentos mil reais, o que resulta em lucros da ordem de duzentos mil reais.

Esta empresa é lucrativa, correto?

Agora, olhemos para a geração de caixa da empresa. Aqui, tratamos apenas do fluxo de caixa operacional para facilitar a compreensão do leitor.

No ano de 2018, a empresa não contou com entrada de caixa, uma vez que o pagamento da máquina ficou agendado para o final de 2019. Assim, não temos entrada de caixa neste ano.

Em relação às saídas de caixa, a empresa já realizou o pagamento de todos os custos e despesas, portanto, os trezentos mil reais anteriormente mencionados representam as saídas de caixa no ano de 2018.

Deste modo, temos que a operação gerou um fluxo de caixa negativo de trezentos mil reais.

Note que mesmo que a empresa declare lucros no período, em 2018 os fluxos de caixa foram negativos.

A situação inversa também pode ocorrer. Uma empresa pode ter grande poder de barganha no mercado devido, na maioria dos casos, ao market share elevado que possui.

Pense no caso da Ambev. A empresa conta com longo prazo para pagamento de seus fornecedores, entretanto, realiza suas vendas com prazos pequenos. Assim, antes que a companhia desembolse caixa com as despesas e custos, ela já recebeu o pagamento dos clientes.

Neste caso, o fluxo de caixa da empresa pode ser ainda maior do que os lucros do período.

Pense na seguinte operação. A Ambev realizou uma venda à vista de um lote de cervejas no valor de quinhentos mil reais no dia 10 de novembro de 2018. O recebimento do pagamento do cliente ocorreu na data da venda.

Para fabricar o lote, a empresa teve custos e despesas no valor de trezentos mil reais, entretanto, como a Ambev tem grande força nas negociações, ela pagará seus fornecedores apenas no dia 10 de março de 2019.

Analisemos a DRE neste caso. A empresa faturou quinhentos mil reais e teve custos e despesas no valor de trezentos mil reais. Os lucros da empresa totalizaram duzentos mil reais. A DRE é muito semelhante ao caso anterior, correto?

Entretanto, perceba como a DFC é bem diferente. No primeiro caso, a empresa teve de pagar todos os custos e despesas em 2018, porém, só receberá o pagamento da máquina em 2019.

Já no caso da Ambev, a empresa não pagou nenhum custo e despesa em 2018 e recebeu o total das receitas neste período.

No caso da Ambev, o fluxo de caixa operacional é de quinhentos mil reais, enquanto no caso da empresa de máquinas agrícolas, o fluxo de caixa operacional é de trezentos mil reais negativos.

Obviamente esse exemplo foi extremo para que o leitor compreenda as diferenças entre lucro e geração de caixa.

Assim, fica claro que lucros e geração de caixa são elementos distintos e devem ser analisados separadamente. Uma empresa pode ser viável economicamente (lucrativa), porém, devido ao descasamento de prazos de pagamento e recebimento, o negócio pode não ser viável em termos de fluxos de caixa.

ACESSO RÁPIDO
Tiago Reis
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