A tributação dos dividendos: pauta constante no Congresso
O Brasil é um dos poucos países com isenção sobre os proventos dos lucros das empresas e fundos imobiliários, a despeito da altíssima carga tributária incidente na cadeia produtiva. O possível retorno das taxações, neste sentido, é tema recorrente entre os investidores.
Por Jean Tosetto
A Suno Research é uma empresa que incentiva o debate de questões em torno do mercado financeiro e especialmente sobre a renda variável. Além de contar com um grupo moderado no Facebook, a casa de análises mantém uma página denominada “Suno Respostas”.
Dentre os seus principais colaboradores, alguns são bastante ativos no Instagram, onde respondem pessoalmente os seguidores que deixam recados nas postagens. Dentre eles destaco o Felipe Tadewald (https://www.instagram.com/felipe.tadewald/) e a Gabriela Mosmann (https://www.instagram.com/gabrielamosmann/).
Como se não bastasse todos esses espaços, a Suno permite que os leitores de seu site escrevam comentários nos artigos que a casa publica regularmente. Como autor de alguns deles, sempre que possível procuro ler e responder as mensagens.
Algumas delas são tão pertinentes que rendem outros artigos, como este, sobre a possível tributação dos dividendos distribuídos pelas empresas de capital aberto, bem como dos rendimentos dos fundos imobiliários.
A colaboração dos leitores amigos da Suno
O Raimundo, por exemplo, escreveu o seguinte:
“Você já escreveu criticando a tributação de dividendos (https://www.suno.com.br/artigos/candidatos-querem-cobrar-impostos-sobre-dividendos/). Sem mais delongas: o que você acha da reforma tributária do Ministro da Economia Paulo Guedes, que inclui a tributação de dividendos?”
Já o Gabriel demonstrou grande preocupação com o tema:
“Uma dúvida, que tem poluído meus pensamentos há alguns meses, é com relação à reforma tributária e as novas imposições do Fisco que poderão vir em 2020, principalmente com relação aos dividendos. Gostaria de saber sua opinião, Jean, quanto a solidez dos investimentos com foco em dividendos, principalmente em um momento de incerteza tributária para nós investidores de longo prazo. Você acha que a tributação sobre os dividendos passa no Congresso?”
Resolvi condensar uma resposta para ambos e dividir este conteúdo com você, que também poderá opinar assim que este texto for publicado.
Considerando uma possibilidade
Mais importante do que concordar, ou não, com a tributação de dividendos, é estar preparado para sua efetivação após as reformas propostas pelo governo. Um investidor de renda variável, com postura de longo prazo, não deve gastar energia se envolvendo em discussões políticas nas quais ele não consegue interferir – embora isso não o dispense de acompanhar o noticiário político e econômico.
O ano de 2020 será pautado pelas eleições municipais. Acredito que seja difícil que o Congresso aprove qualquer mudança sobre tributos em ano eleitoral. Mas em 2021 essa pauta será posta, muito provavelmente.
Sobre isso, não há muito o que fazer: as propostas para taxação dos dividendos estão partindo de todos os campos ideológicos da política brasileira, desde os progressistas até os liberais. A minoria dos deputados e senadores que se colocam contra esta medida dificilmente conseguirá barrar o seu avanço no decorrer do tempo.
Não tenho bola de cristal, nem pretensão de adivinhar futuro. Minha postura estoica é pensar no que de “pior” pode acontecer para os investidores de longo prazo na Bolsa de Valores de São Paulo: a aprovação da tributação sobre dividendos. Portanto, se este cenário se confirmar, precisamos considerar dois aspectos:
- A estratégia de investir com foco em dividendos continuará válida. Os dividendos já foram tributados no passado e, mesmo assim, investidores como Décio Bazin tiveram sucesso com esta estratégia.
- A iminência da aprovação da tributação dos dividendos provocará volatilidade no mercado. Portanto, quem tiver reservas de capital em renda fixa fará ótimas compras, mantendo o Dividend Yield atrativo, que compensará a queda parcial dos proventos em função do pagamento dos impostos.
Logo, alocar parte do capital em renda fixa é uma atitude inteligente. Não existe essa dicotomia com a renda variável, quando o foco é obter renda passiva. Se a tributação não for aprovada pelo Congresso, esta reserva seguirá lá, pois outra “crise” poderá ocorrer, e vai ocorrer.
Independente disso, nunca podemos viver exclusivamente dos proventos dos FIIs ou das ações. Manter uma margem de segurança para reaplicar parte da renda passiva é fundamental, pois ela pode ser usada em caso de taxação, para cobrir os primeiros meses após o impacto.
Cada investidor pode ser afetado de modo distinto
Para quem está começando a investir em renda passiva agora, uma eventual tributação para os dividendos terá pouco significado, uma vez que a principal parte dos aportes regulares ainda será oriunda da renda trabalhada e poupada pelo cidadão.
Quem já reinveste a renda passiva para comprar mais ativos geradores de renda passiva, sentirá a diferença com maior intensidade, principalmente nos primeiros meses após a aprovação da tributação referida. Neste caso, pode haver uma turbulência a caminho? Sim. Mas depois é vida que segue.
O risco maior, por incrível que pareça, será corrido por aqueles que já atingiram um patamar de independência financeira e já usufruem de grande parte – ou da totalidade – dos proventos que hoje são isentos de impostos.
Por exemplo: o investidor tem um custo de vida mensal de R$ 10 mil pagos integralmente com a renda passiva. Havendo uma tributação entre 15 e 20%, essa renda pode cair para R$ 8 mil facilmente, ou até para um patamar inferior, caso as empresas decidam reduzir seus payouts para evitar o pagamento de impostos.
Aqui vale a pena reforçar o conceito da margem de segurança: quem tem gastos mensais de R$ 10 mil, precisa aferir cerca de R$ 13 mil com renda passiva. O excedente reinvestido com diligência fortalece o crescimento patrimonial, podendo ser usado para socorrer o investidor em períodos de tempestades.
Mudam as circunstâncias – o conceito permanece
A eventual taxação dos proventos de empresas e fundos imobiliários, desde que ocorra dentro de um padrão de normalidade vigente em vários países do mundo, não afetará a estratégia de investimentos com foco na obtenção dos dividendos. Para tanto, basta verificar o histórico do mercado de capitais brasileiro dos últimos 60 anos.
De acordo com Gerard Haentzschel, autor do livro “Ações & precauções”, até 1964 a tributação sobre dividendos para acionistas de sociedades anônimas era de achacadores 86%, na fonte. Quando ele publicou seu livro pioneiro sobre os dividendos, em 1973, a cobrança havia caído para aceitáveis 15%.
Em meados dos anos de 1960, o Governo Militar promoveu uma reforma no Sistema Financeiro Nacional, desaguando na origem da moderna Bolsa de Valores de São Paulo em 1967. Se considerarmos este ano como ponto de partida, os dividendos das ações das companhias brasileira de capital aberto foram tributados, em níveis suportáveis, durante 28 anos.
Nesse tempo, investidores como Luiz Barsi Filho e Décio Bazin, autor do livro “Faça fortunas com ações antes que seja tarde” atingiram a independência financeira investindo com foco na estratégia dos dividendos.
O texto do livro do Bazin, inclusive, foi finalizado em 1992 e revisado em 1994. Somente em dezembro de 1995 o então Presidente Fernando Henrique Cardoso sancionou a Lei 9.249, sobre isenção de tributos para os dividendos pagos a acionistas das empresas listadas em Bolsa. O objetivo da Lei era incentivar o brasileiro a investir no mercado de capitais, após o país domar a hiperinflação que reinava por mais de uma década.
Na esteira da estabilidade econômica, com a criação do Plano Real, em 1994 a Instrução 205 da Comissão de Valores Mobiliários regulamentava a constituição, funcionamento e administração dos FIIs. Porém, somente em 2005 o então Presidente Luiz Inácio Lula da Silva promulgou a Lei 11.196, autorizando a isenção de imposto de renda sobre o rendimento de fundos imobiliários para pessoas físicas.
Uma janela que poderá ser fechada
Portanto, em fevereiro de 2020 o Brasil contava com menos de 25 anos de isenção de impostos sobre dividendos distribuídos por empresas de capital aberto; e menos de 15 anos de isenção de impostos sobre os rendimentos de fundos imobiliários para cotistas individuais.
Logo, o retorno da tributação incidente sobre os proventos não representará o fim da estratégia de investimento em ativos geradores de renda passiva, embora provocará atrasos na já longa caminhada dos investidores rumo à independência financeira.
Há quem defenda que FIIs não devam ter rendimentos taxados novamente, por funcionarem com lógica distinta das empresas e incentivarem o mercado imobiliário, que é gerador de empregos para um grande contingente de mão de obra de menor qualificação. Este é mais um ponto que os congressistas deverão discutir.
Em tempo, cabe fazer uma ressalva a respeito dos Juros Sobre o Capital Próprio – JCP ou JPSC – que as empresas distribuem aos seus acionistas antes da apuração do lucro líquido, de modo que este tipo de provento é visto como despesa para a companhia, o que reduz sua margem de lucro, mas gera economia com o pagamentos de impostos, geralmente cobrados na ordem de 25% sobre os resultados contábeis. Apesar disso, os JCPs já são tributados na fonte em 15%.
Ao seu lado, sempre
Por fim, a Suno continuará pregando a estratégia dos dividendos e o investimento em longo prazo, por uma razão simples: ela quer acompanhar o investidor ao longo de sua jornada. A Suno deseja uma parceria de longo prazo com investidores de longo prazo, por entender que esta parceria beneficia todo mundo.
Não por acaso, a Suno oferece vários planos de assinatura, para dar suporte ao investidor de renda variável, independentemente do estágio em que se encontra. Confira:
https://www.suno.com.br/nossas-assinaturas/
[Crédito da imagem: “Moghul Lion Hunt” (circa século VXII), pintura de autoria desconhecida]