A origem das marcas
Uma coisa interessante sobre a vida anterior ao século XIX é que a maioria das pessoas nunca havia experienciado o mundo que existia além de algumas dezenas de quilômetros de distância do local em que viviam. Atravessar longas distâncias era difícil, caro e demorado.
A vida era, portanto, algo restrito ao seu local. As comidas eram cultivadas na cidade. As casas eram construídas por pessoas locais, assim como as roupas também eram confeccionadas por pessoas locais.
As revoluções industriais e a Guerra Civil Americana foram eventos que mudaram muitas coisas. Milhões de pessoas estavam, de repente, se movendo para lugares muito mais distantes. As ferrovias levavam pessoas e produtos mais rápido e mais longe do que jamais visto antes.
Quando os grandes centros começaram a tomar uma forma mais urbana, a quantidade de comida e roupas produzidas localmente começou a diminuir. Novos tipos de comida processada foram inventados. Muitos homens americanos tiveram seu primeiro contato com comidas enlatadas durante a Guerra Civil.
Certamente, podemos considerar este um dos grandes avanços da história. Mas ele não veio só com benefícios, como também trouxe problemas.
Pela primeira vez, os consumidores estavam desconectados da produção de suas coisas. Durante um grande período da história, um produto ruim significava um erro próprio, já que muitos produziam suas próprias coisas, ou em outros casos, o produto ruim poderia ser levado até o produtor local para reclamação.
Já as comidas enlatadas eram fabricadas em lotes, por dezenas de fornecedores regionais, os quais não eram conhecidos por nenhum dos clientes. Sem controle adequado, a qualidade era terrível.
As pessoas corriam o perigo de comprar alguma comida prejudicial. Os distribuidores não tinham escrúpulos. Ninguém sabia em quem confiar. No entanto, a William Underwood Company resolveu este problema.
A empresa começou envasando condimentos e conservas em potes de vidro, sendo pioneira nesta atividade. Posteriormente, também foi pioneira em enlatar alimentos. Quando a Guerra Civil Americana começou, a companhia supriu a demanda por carne enlatada, aperfeiçoando o produto, que a empresa chamava de “Deviled Ham”.
As pessoas amavam o produto da Underwood Company, mas o boom da produção de carne enlatada conferiu à indústria inteira a reputação de inconsistência no produto: às vezes a carne estava estragada, às vezes aguada… Não existiam latas com conteúdos consistentemente iguais.
Como a Underwood Company possuía um bom produto, ela resolveu este problema da inconsistência ao marcar seu produto, para que o público o reconhecesse. Deste modo, a companhia colocou seu personagem nas latas: um diabinho vermelho.
A logomarca recriou a familiaridade que o comércio cara-a-cara era capaz de conferir anteriormente. Não importa em que parte do país os consumidores estivessem, eles sabiam que, se a lata tivesse o diabinho vermelho estampado, ela teria um conteúdo de qualidade. Era um produto específico, feito por uma empresa específica, com padrões de qualidade específicos.
Deste modo, os consumidores vieram a associar a logomarca do diabinho com algo que previamente não existia: consistência.
Em 1867, a Underwood Company levou a logomarca para Washington e criou a marca. A ideia se espalhou rapidamente. Em 1870, existiam 120 marcas comerciais. A título de comparação, apenas em 1906, foram registradas mais de 10 mil marcas comerciais.
É interessante observar que a Underwood não era reconhecida como tendo o melhor produto no mercado, embora tivesse boa qualidade. Ela era reconhecida pelo fato de que os consumidores sabiam exatamente o que esperar dela.
Uma marca não é sobre ter a melhor qualidade, necessariamente. Também não é sobre confiança. É sobre saber o que esperar. Por exemplo, as pessoas não confiam na Coca-Cola, elas sabem o que esperar da Coca-Cola. Esta é a essência de uma marca.
O grande insight a respeito das marcas é que os consumidores detestam surpresas desagradáveis mais do que gostam das chances de encontrar a perfeição. As companhias excelentes combinam perfeição com consistência – a Apple é um bom exemplo disso.